Friday, March 29, 2013

A minha Mãe

Chove.

A minha Mãe branca, fria, silenciosa, coberta de flores.

Chove.

O meu Pai arranca do coração gritos de pedra.

Chove.

Nós emudecemos de espanto da ausência

que entra pelos olhos dentro e nos cega.

O meu Pai recorre os passos da vida dele.

                                                da vida dela.

                                                da nossa vida.
Como uma via sacra.

Chove.

Chove. Ou não chove.

Quem passa, deixa palavras que mal se ouvem.

O meu Pai em solilóquios de dor não acredita.

Sabe que as pessoas chegam e partem

partilham o seu sofrimento

e ele percebe isso e fica incrédulo.

Parou de chover.

A minha Mãe esconde-se num buraco escavado no chão.

Cobriram-na de rosas vermelhas. Nós temos os olhos vermelhos.

Já não temos lágrimas.

Andamos por ali como sonâmbulos enlouquecidos.

A falar baixinho. Sem falar. A trocar tudo.

Aos abraços. A alma aos tropeções.

Chove.

A minha Mãe, branca, fria, coberta de flores.

Sempre que voltarmos de longe ou de perto,

se demorarmos muito ou pouco,

quando abrirmos a porta,

Ela já não vai estar lá, como sempre esteve, à nossa espera.

Chove. Outra vez.