Thursday, November 16, 2006

Manias


Tinha uma mania . Sempre tive esta mania. Agora menos, mas, de vez em quando , descuido-me e trás! ponho-a em prática. Quase nunca dá bom resultado. Mas que eu fico bem comigo mesma, isso fico. Tinha uma mania: dizia tudo o que me vinha à cabeça. Com o coração ao pé da boca. Era um aborrecimento. Não para mim, para quem ouvia, ninguém gostava, acho que ainda ninguém gosta de ouvir as opiniões francas e abertas. Quanto mais à vontade me sentia, mais sinceridades me saíam, muitas vezes, em forma de ironia, que ninguém percebia. E o que podia ser uma amena cavaqueira transformava-se num digladiar de argumentos que me esgotava, porque nem sequer davam às minhas palavras o sentido que eu lhes atribuía, inventavam segundos, terceiros, quartos, quintos e sextos sentidos que eu até ficava siderada. pensava eu, com uma ingenuidade impressionante que, se explicasse tudo tim-tim por tim-tim muito bem explicadinho ( deformação profissional) , tanto malentendido se esclarecia. Puro engano. Arranjava um sarilho ainda maior. Então, com o tempo passante, fui-me vigiando, fui vigiando as palavras, escondendo opiniões, remetendo-me ao silêncio, no meu canto, observando, pensando mil vezes antes de falar. Puxava-me a minha filha o braço, como se faz às crianças pequenas ou dá uma entoação à voz de doce raspanete, a dizer-me que não ganho juízo. Às vezes, baixo a guarda e, antes de contar até mil, lá pela octingentésima septuagésima quinta vez, falo. Rápida. Contundente. Rotunda. Detestam-me, mas calo logo as pessoas. Da surpresa. Depois , rio-me comigo própria. Por não ter juízo nenhum, meto-me nisto como uma brincadeira de crianças. Remeto-me outra vez ao silêncio. Durante muito tempo. Exercito as minhas piadas com a minha filha, com a minha irmã do meio... com algumas pessoas perspicazes. Muito de vez em quando, volto à carga, esqueço-me. Falo. Rotunda ( palavra que, além de significar, por exemplo, sendo substantivo feminino, construção de forma circular, também significa decisivo, categórico, empregado como adjectivo... explico, por via das dúvidas... não sei é se o nome " rotunda" é animado ou não animado...porque os carros à sua volta circulam sem cessar que é uma animação pegada, sobretudo em horas de ponta!!!). Irónica. Mas acrescento a correr, ao ver as caras de espanto: "estou a brincar" e sorrio , um sorriso pateta, por ter que explicar uma frase irónica , tão evidente para mim. E dou comigo a pensar que afinal , ultimamente, tenho repetido vezes sem conta que "estou a brincar". Ando a repetir-me muitas vezes. Não sei se me cale de vez, se me deixe de ironias. Mas a ironia é estética e usada por pessoas inteligentes. Então, talvez, digo talvez, continue a falar. Devagarinho. Baixinho. De vez em quando. Com ironia. E , se ninguém entender, falo para as pedras. O outro não falava para os peixinhos?

2 comments:

vareira said...

POR FAVOR...NUNCA TE CALES!(è mesmo eu gritandooooooooooooooo)

vareira said...

Por quem cala consente, e o mundo não gira com a apatia dos calados.Falar falar, falar com o coração na boca porque não?é aqui que a sabedoria está, juntamente com o sentimento e a ilusão que os outros nos ouçam.E pensa...tu falas, ironicamente...para outros que ironicamente não ouvem,hipocritamente não ouvem...mas depois sabem apenas, que foste irónica!Bj