Thursday, March 12, 2015

Fugaz

Preciso de terras, lugares,
pessoas concretas
para dissipar as incertezas
as dúvidas discretas.

Busco confirmação
só para saber que não sonhei
nem inventei nada:

Aquela praia era uma baía,
uma concha, o paraíso,
reencontro na lembrança,
uns grãos de areia fina,
na realidade encontro
um livro minúsculo,
umas fotos antigas
o sabor a maresia
e as cores variadas
das ervilhas-de-cheiro.

Preciso de saber: não sonhei,
Não inventei nada.

Naquela praceta
havia um fontanário
ali perto da porta vermelha,
hoje é verde-esperança.

Naquele outro sítio
é um jardim em frente
ao colégio misto,
ainda lá está, mas eu insisto
em ver. Não sonhei
não inventei nada.
E a Judite ainda lá vive
contudo sem trança.

Além,

Fecho os olhos:
A voz da avó ecoa
Por aquelas quebradas
E, dentro do forno,
Acabada de cozer: a broa.
De manhã, ouço a colher
A mexer o café
No caçoilo de barro.
Nem quero abrir os olhos
Que é tudo uma ilusão
que se some de repente
se me esquecer.

Antes de abrir os olhos,
quero ver ainda
o avô de enxada
às costas, a sorrir
ao fundo do caminho.
E a avó, de lenço
de ramagens na cabeça
sacode o avental
junto ao portão.
Abro os olhos devagarinho
e o avô ajeita o chapéu,
como quem nos abençoa,
a avó de lenço na cabeça
a acenar, a chamar,
a desaparecer, a esfumar-se.
Abro os olhos sem pressa,
contra o sol que me encandeia,
me atordoa.
Já não vejo nada,
não vejo ninguém.
Preciso de terras, lugares,
de chamar à vida pessoas concretas,
que a nossa vida só faz sentido,
enquanto eu me lembrar.




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