Sunday, December 06, 2015

caminho sobre a terra dos meus avós
e sinto a terra sumir-se debaixo dos pés.

sento-me, à sombra, nos degraus à porta de casa
numa tarde quente de Maio, podia ser Agosto.

rareiam as palavras, o caminho vazio,
só chegam ecos de longe na tarde de calor.

a estrada engoliu um caminho que nunca existiu,
a eira reduzida a umas lajes tristonhas.

o carreiro antigo anda ali às voltas para se encontrar
e os tanques na velha fonte  agonizam entre paredes.

à noite, pela janela aberta, entra o silêncio, o sino a rezar,
os cães a ladrar e as luzes reflectem-se douradas, no rio.

voltamos à casa, esperamos ouvir lá dentro a avó,
mas não cheira a café, nem a broa, nem o forno está aceso.

olhamos o fim do caminho, a qualquer momento, o avô
pode aparecer, chapéu na cabeça, enxada ao ombro.

desviamos o olhar um instante, e voltamos a lançar os olhos
lá para o fim da ruela, pode ser que as ovelhas precedam o avô.

pode ser que ainda chegue a tempo da noite estrelada
e que nos sentemos com ele  muito quietas a olhar o céu.

pode ser que, entre todos aqueles pontinhos brilhantes,
na noite escura, diante dos dedos do avô, avistemos a estrela polar.


in POEMÁRIO 2016
Pastelaria Studios