Thursday, January 26, 2012

Chávena

junto de outras chávenas,
penduro a chávena branca com flores azuis:
fica a tinir música num riso muito fino.

o sol atravessa a vidraça,
as sardinheiras vermelhas florescem,
os pássaros andam estouvados em círculos.

Thursday, January 12, 2012

Tempo

tantos sóis passados
as luas em mil crescentes e decrescentes
novas e cheias
a água a passar por debaixo das pontes
as ribeiras secaram nos leitos cansados
pontes caíram esgotadas e frágeis
ajoelharam nas lajes das igrejas os crentes
em orações mágicas, fantásticas panaceias
eclipsaram-se umas atrás das outras as primaveras
as neves acumularam-se no alto das serras
escorreram pelas encostas em delírio,
deram de beber às nascentes
vieram e partiram outonos de folhas caídas
e os verões ganharam-se e perderam-se
como areia escapulindo-se por entre os dedos
vivemos vidas mais que as que esperávamos
entre paredes vazias caiadas de medos
e esperanças arrancadas a ruas de alegria
caímos umas tantas vezes mas sobrevivemos
andámos à procura da harmonia dos deuses
ainda andamos à procura andaremos sempre,
na balança, as impossibilidades e as ilusões
desequilibradas as forças, os ganhos, as perdas,
cruzaram-se e descruzaram-se os caminhos
em mil e uma voltas até ao fim do labirinto,
já não somos os mesmos, não estás à minha espera
na praça onde os pássaros se perfilam nos fios,
nem eu te escrevo poemas inconsequentes,
continuamos a ouvir canções à beira dos rios,
a sonhar chuvas e sóis em românticos poentes,
a desconstruir estradas nos céus desconhecidos,
ninguém colheu as amoras à beira da estrada
no verão passado e agora mirraram da espera,
sob a neblina, o musgo verde cobre as pedras,
ainda suspiramos perante o arco-íris completo,
bate forte o coração ao sentir na boca
o sabor antigo de pêssegos verdadeiros
e, junto ao mar, a alma baloiça entre loucas
tempestades e a bonança (in)esperada,
somos capazes de tudo, outras vezes de nada,
queima-nos o sol, tolhe-nos o frio,
sacudimos fantasmas, viramos páginas,
sofregamente, bebemos as noites, os dias...
agora, cai a tarde, nasce a ternura...